O cenário é cada vez mais complicado em relação ao novo coronavírus no continente europeu. Itália e Espanha são neste momento os casos que mais preocupam as autoridades mas a situação é tão volátil que a qualquer momento os números podem disparar noutros países. Nesta quinta-feira, o número de infetados subiu para os 19 no Luxemburgo e para os 78 em Portugal aprofundando o debate na sociedade sobre a gestão política desta crise. No Grão-Ducado, quase um em cada dois residentes no Luxemburgo desconfia da estratégia do governo para enfrentar o novo coronavírus. Em Portugal, são muitas as críticas à decisão do executivo de António Costa de manter as escolas abertas.
Mas a China, onde surgiu o vírus COVID-19 que provocou 3196 mortos e 80793 infetados, registava esta quinta-feira apenas 15 novos casos de infeção, muito longe dos 15 mil novos casos que se anunciavam num dia como hoje há um mês. As taxas de contaminação no gigante asiático têm diminuído gradualmente nas últimas semanas e, neste momento, apenas permanece um último foco na província de Hubei onde tudo surgiu. Com a regressão dos casos ativos, 11 dos 14 hospitais temporários que foram construídos na cidade de Wuhan em apenas dez dias para tratar pacientes com o novo coronavírus estão agora encerrados. Agora, a prioridade das autoridades chinesas é evitar a importação de casos do exterior do país à medida que a epidemia se estende pelo planeta.
China ajuda Itália
A batalha que se trava em Itália recebeu um inesperado aliado. Quando Roma pediu para ativar o Mecanismo de Proteção Civil da União Europeia para o fornecimento de equipamentos médicos de proteção individual nenhum país respondeu ao apelo da Comissão Europeia. Foi a China que acudiu ao desespero das autoridades italianas com material e especialistas.
De acordo com a agência italiana ANSA, Pequim vai enviar mil ventiladores pulmonares, dois milhões de máscaras, entre elas, 100 mil de alta tecnologia, e uma equipa de médicos e outros materiais de saúde. Na terça-feira, o ministro italiano dos Negócios Estrangeiros, Luigi Di Maio, manteve uma conversa com o seu homólogo chinês, Wang Yi, para discutir o assunto. Por sua vez, Yi expressou as mais profundas condolências em nome do seu país pela situação em Itália.
A batalha que mudou o curso da epidemia
Com uma das mais duras crises na história deste país desde a revolução em 1949, a Organização Mundial de Saúde (OMS) não poupa elogios à atuação das autoridades chinesas perante o novo coronavírus. “A China mudou o curso do surto dentro do país. O que era um crescimento rápido, estabilizou e começou a descer mais depressa do que alguém pode esperar quando se observa a dinâmica natural neste tipo de situações. Centenas de milhares de casos foram evitados na China graças a esta intervenção agressiva”, afirmou na semana passada Bruce Aylward, chefe da missão de especialistas da OMS naquele país, de acordo com a SER.
O epidemiologista canadiano visitou várias cidades do país asiático para conhecer em primeira mão a evolução do surto e reconheceu que não tinha visto nada igual em 30 anos de carreira. “É o resultado da aplicação do que alguns consideram ser padrões antigos e básicos de saúde pública com um rigor de uma forma nunca antes vista na história. Basicamente o que eles têm feito é encontrar casos de contágio, isolá-los e aplicar limitações ao movimento”.
Depois de acompanhar de perto o combate ao surto, Bruce Aylward apontou categoricamente, segundo a SER, que o resto do mundo ainda “não está pronto” para conter a epidemia. O especialista da OMS mostrou-se positivo e pensa que ainda há tempo “se houver uma mudança de mentalidade sobre como vamos gerir a doença”. Para isso, incentiva a seguir os passos da China: “Quantos países têm planos para ter camas hospitalares, ventiladores, fornecimento de oxigénio, capacidade laboratorial”, questionou.
O facto é que, de acordo com o responsável da OMS, a China deu uma lição ao mundo e demonstrou que as dúvidas sobre a capacidade do gigante asiático em conter o surto eram infundadas. “A novidade e a nossa compreensão, em constante evolução, sobre a natureza deste coronavírus exige uma tremenda agilidade na nossa capacidade de nos adaptarmos rapidamente e de mudarmos a nossa preparação e a nossa planificação para dar resposta, como tem sido feito continuamente na China. É um feito extraordinário para um país de 1,4 mil milhões de pessoas”.
As cinco estratégias fundamentais para fazer recuar o vírus
De acordo com Bruce Aylward, são cinco as estratégias postas em práticas por Pequim que foram fundamentais para debelar o surto. Em primeiro lugar, as restrições impostas à maioria dos movimentos em Wuhan, o epicentro do surto. O encerramento de fábricas e o regresso faseado da produção é apontado como outra das medidas importantes. Investigar e intervir em cada foco ajudou a combater o alastramento do vírus assim como a construção de hospitais especializados na luta contra o Covid-19 a par de um acompanhamento científico “muito ágil”.
Num relatório sobre a China, a OMS elogiou “a notável rapidez com que cientistas chineses e especialistas em saúde pública isolaram o vírus causal e estabeleceram ferramentas de diagnóstico e determinaram parâmetros-chave de transmissão, bem como a rota de propagação e o período de incubação, fornecendo a base de evidências vitais para a estratégia da China e ganhando tempo inestimável para a resposta”.
O relatório também destaca a boa organização na execução de todo o protocolo. “As estruturas de resposta na China foram rapidamente implementadas de acordo com os planos de emergência existentes e alinhadas de cima para baixo. Isto foi repetido em todos os quatro níveis de governo: nacional, regional, distrital e local.
Europa só deve conter surto em junho
A Economist Intelligence Unit (EIU), ligada à revista The Economist, que realiza previsões, investigações e análises económicas, publicou as novas previsões em que projeta limites no tempo para a expansão do novo coronavírus. O relatório da EIU prevê que a China tenha o Covid-19 sob controlo até ao fim de março. Já o resto do hemisfério norte só vai conseguir controlar a doença no fim de junho. Para o hemisfério sul, a estimativa aponta para o fim de setembro. “Esperamos que o vírus ressurja como um vírus sazonal mas os governos estarão mais bem preparados para gerir o seu regresso”, acrescenta a publicação assinada por Fiona Mackie, diretora da consultora para a América Latina e Caribe.