[dropcap type=”3″]H[/dropcap]á dois anos, quem olhasse para a marginal direita da via Anchieta, sentido capital, poucos metros antes da montadora Ford, em São Bernardo do Campo, teria uma imagem desagradável: um amontoado de casas de madeira parecia disputar um espaço inexistente. Nos registros públicos desse município do ABC paulista, aquele era o Jardim Silvina, embora poucos se referissem a ele pelo nome oficial. O bairro era conhecido como favela do Montanhão, onde quase oito mil pessoas se espalhavam em mais de duas mil moradias precárias e irregulares, sem água encanada, iluminação e saneamento básico. As 30 escadarias que cortavam o local obrigavam a comunidade a ter força nas pernas. Numa dessas vielas, chamada de passagem dos Cafezais, eram quase 300 degraus de pedra para chegar ao topo. Mas a preocupação maior não era como subir, mas com o que vinha dos céus. As chuvas sempre traziam o risco de provocar uma enorme tragédia.

Daqui a três meses, nada que vier do céu vai assustar. Será possível admirar um dia ensolarado, uma tarde chuvosa ou uma noite de lua cheia. A paisagem castigada pela falta de urbanização estará definitivamente no passado. O Montanhão está dando lugar ao Residencial Ponto Alto, um projeto do Programa Minha Casa, Minha Vida. Mais que uma jogada de marketing, o novo nome serve como virada de página para os moradores da região. Se o Montanhão estava ligado às ruas sem endereço nem numeração, insegurança e falta de cidadania, o Ponto Alto está começando a recuperar a autoestima com uma movimentação muito comum a qualquer bairro: carteiro, ônibus, táxis e caminhões de lixo circulando pelas novas ruas, que estão sendo criadas e pavimentadas pela prefeitura de São Bernardo do Campo. “Antes não existia iluminação, asfalto nem movimentação de pessoas que não eram da comunidade”, diz o morador Silas Vinícius Santos da Silva, 27 anos. “Se antes éramos mal vistos e vivíamos com muito sofrimento, agora já nos sentimos parte da sociedade.”

Silva é um protagonista dessa mudança. Ele é um dos 120 funcionários contratados pela Odebrecht Infraestrutura para participar da construção do Ponto Alto. Dos 285 profissionais que trabalham no projeto, pouco mais de 40% foram recrutados na vizinhança. A movimentação no canteiro de obras, em julho do ano passado, com o início da terraplanagem do terreno, numa área bastante irregular e íngreme, atraiu a atenção pelo vai-e-vem de máquinas pesadas. A companhia saiu a campo para conversar com os moradores, explicar todos os passos que viriam a seguir e os cuidados que eles deveriam tomar para se manter seguros durante o dia de trabalho. A empresa se comprometeu a manter a limpeza do local e passou a avisar que estava recrutando interessados em participar da construção de dois condomínios de 12 torres cada, entre cinco e oito andares, num total de 560 unidades. “Tenho 20 anos na construção civil e um colega me avisou que a empresa estava contratando, com benefícios”, diz o pedreiro Rivadal Dias de Sousa, 38 anos. “Não podia deixar passar a oportunidade.”

Como Rivadal, havia centenas de interessados em ter o registro em carteira e um contrato de 18 meses com a Odebrecht Infraestrutura. Mais importante, porém, era participar de uma mudança na própria região, em sentir que o que estava sendo erguido seria para uso de todos. A cada etapa cumprida é comum ouvir a comemoração que “mais duas famílias ganharam um teto”. É esse envolvimento que a construtora procurava com a obra: uma oportunidade de transformar em realidade parte de sua cultura empresarial, que começou a ser criada por Norberto Odebrecht nos anos de 1940. Para o fundador da empresa, crescer, criar e inovar é uma questão cultural. “O emprego direto é um dos nossos compromissos na relação de confiança estabelecida com a comunidade”, diz o diretor responsável Giorgio Bullaty Neto. “Queremos contribuir com a transformação e mostrar que algo especial acontece quando a condição de vida melhora.”

A participação de moradores locais e a cumplicidade com a comunidade ajudam a Odebrecht a espalhar a importância de manter a obra no prazo – que será entregue em dezembro deste ano. Diariamente, três novas lajes ficam prontas. A motivação no canteiro de obras é tirar, o mais rápido possível, as famílias da situação ruim. A velocidade tem a ver com o trabalho em equipe, mas o desenvolvimento de uma nova tecnologia permitiu que o Ponto Alto mantivesse um bom ritmo de trabalho. Como essa é uma obra de menor porte para a construtora, era preciso ter uma equipe enxuta e eficiente para que tudo funcionasse sem percalços, dos custos ao prazo. A inovação técnica da Odebrecht Infraestrutura foi criar uma forma de alumínio, que permite a construção de paredes maciças de concreto, com telas soldadas que recebem as instalações hidráulicas e elétricas. O trabalho é feito por 30 pessoas e, em 14 horas, essa estrutura está pronta e a forma de alumínio pode ser retirada. “Sem essa metodologia não seria possível entregar a obra em 18 meses”, afirma Bullaty Neto.

Os 120 moradores que trabalham para a empresa estão ansiosos por uma segunda oportunidade. A maior parte deles recebeu cursos técnicos, de aprimoramento e de aperfeiçoamento, o que pode fazer deles candidatos naturais a ocupar uma vaga em uma das novas obras da construtora. Silas da Silva começou como ajudante e agora é sinaleiro, o responsável pelas manobras do guindaste fora da cabine de comando (normalmente onde a grua chega, mas o motorista não tem visão). Rivadal Sousa, mesmo com experiência, foi ajudante antes de virar pedreiro. “Nunca pensei em trabalhar com a construção civil, mas agora eu tenho uma profissão”, diz Leandro da Silva Souto Maior, 30 anos, que é um dos montadores responsáveis por fechar as paredes de fora dos prédios. De todas as formas, a conclusão do Residencial Ponto Alto vai entregar uma nova esperança de vida para a comunidade.

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