Abandonado e cheio de problemas, o Maracanã terá seu futuro decidido nas próximas semanas. A Odebrecht decidiu vender sua concessão, válida por mais 31 anos, e há duas interessadas: Lagardére e a GL Events. Nos bastidores, as empresas estão em guerra.

E um fator, no momento, pesa na disputa. A Lagardére quer verificar o estado atual do estádio para descontar eventuais reformas antes de pagar o preço de R$ 60 milhões, mesmo valor que vem sendo oferecido pela GL, que não faz tal exigência. Topa assumir o estádio do jeito que ele estiver.

Em janeiro, reportagem de “O Globo” revelou que o estádio está abandonado e com incontáveis problemas. O GloboEsporte.com ouviu todos os envolvidos na disputa e nenhum deles consegue estipular quanto dinheiro será preciso investir para deixar o estádio pronto para receber jogos.

Após o fim da cessão do estádio ao Rio 2016, a Odebrecht não aceitou de volta o Maracanã por considerar que não estava nas mesmas condições que entregou. Contas atrasaram, luz foi cortada, segurança reduzida a poucos indivíduos para um complexo enorme, e os furtos começaram já nos primeiros dias de dezembro.

A empreiteira acabou obrigada a reassumir a gestão por força de uma liminar em janeiro. Porém, apesar de dois pedidos da Federação de Futebol do Rio de Janeiro (Ferj) para responder sobre a possibilidade das semifinais da Taça Guanabara acontecerem no Maracanã, não houve resposta da Odebrecht. A Ferj entrou na Justiça.

Disposto a agilizar o processo, já que não tem condições de reassumir o imóvel em meio a uma grave crise financeira, o governo deve concluir até esta sexta-feira a análise da documentação das concorrentes – para verificar a capacidade financeira e outros aspectos. A partir daí, a decisão é da Odebrecht.

As turbulências nessa disputa, que já se arrasta por meses – a Odebrecht comunicou oficialmente ao governo o desejo de deixar a concessão em julho de 2016 -, provocaram alterações nos planos dos concorrentes. A Lagardére excluiu do processo a BWA, sua parceira no Castelão e no Independência, os dois estádios que ela administra no Brasil.

A parceria da Lagardére com a BWA é inicialmente o motivo de o Flamengo não querer fechar acordo com os franceses. O clube já tem um acordo com a dupla GL Events e CSM, mas anunciou que não fará o mesmo se o outro grupo vencer.

A cúpula do clube ainda se posiciona de forma cética à saída definitiva da BWA do negócio. Não deverá acontecer um acerto com a Lagardére antes de a decisão da Odebrecht ser anunciada, mas, sem a BWA, pode ocorrer uma negociação com se os franceses vencerem a disputa. O Fluminense, por sua vez, tem acerto com ambos os concorrentes.

Patrimônio do Estado do Rio de Janeiro, o Maracanã era antes da reforma para a Copa do Mundo de 2014 operado pela Suderj, um órgão estadual. Desde 2013, está nas mãos de um consórcio, formado por Odebrecht (95%) e AEG (5%), e que quer se livrar do estádio.

Inicialmente, a IMX, de Eike Batista, também tinha sua fatia de 5%, percentual que foi comprado pela empreiteira. No período, o estádio acumulou prejuízo de R$ 173 milhões. Por isso, o consórcio quer vender o que falta de seu contrato de concessão.

Diferenças entre as propostas

A francesa Lagardére quer administrar sozinha o Maracanã. Tanto é assim que a empresa não levou para a briga do Maracanã a BWA, sua parceira no Independência e no Castelão. Porque esse é seu negócio: a empresa gere cerca de 60 estádios no mundo, entre eles os de Atlético de Madrid, PSG e Borussia Dortmund. O governo estadual confirmou que não há documentação da BWA no processo de análise das concorrentes.

Do outro lado, a brasileira GL Events lidera um consórcio do qual também faz parte a inglesa CSM. A GL administra a Rio Arena, ginásio usado no torneio de basquete do Jogos Pan-Americanos de 2007. A GL conta com consultoria da Amsterdam Arena e com a preferência do Flamengo.

Segundo o GloboEsporte.com apurou, as duas empresas pretendem oferecer valores parecidos para assumir o contrato da Odebrecht (cerca de R$ 60 milhões). Mas há uma diferença importante: a Lagardére condiciona os pagamentos ao fato de conhecer em detalhes o estado em que o Maracanã se encontra. Ou seja, não pretende incluir no preço valores de eventuais reformas que tenham de ser feitas para que o estádio volte a receber jogos e eventos. Como a concorrente não faz tal exigência, a Odebrecht considera a proposta da GL mais palatável.

Relação com os clubes

O Flamengo já deixou claro em mais de uma ocasião que está do lado da GL/CSM. O presidente Eduardo Bandeira de Mello chegou a afirmar que, se a Largarére vencer a concorrência, seu time não jogaria no Maracanã.

Para contornar esse obstáculo, a Lagardére entende ser possível fazer o Maracanã dar (pouco) lucro sem o Flamengo, e transformar o estádio no “palco do futebol carioca”. Para isso, teria que preencher o calendário com jogos dos outros três grandes. Há conversas em andamento. A saída da BWA do cenário, contudo, pode mudar a posição dos rubro-negros que, por ora, ainda se mostram descrentes de que a empresa não fará parte da operação se os franceses vencerem a concorrência.

A GL acena com uma relação muito mais próxima com Flamengo e Fluminense – e a garantia de que os dois clubes mandariam seus jogos no estádio. A empresa ficaria com a parte de entretenimento, incluindo visitas guiadas, em faria em conjunto com a CSM a exploração de propriedades comerciais e camarotes. A gestão do futebol será feita diretamente pelos clubes. Ingressos, custos diretos de operação, acesso, envolvimento total das equipes nessa parte.

É justamente a isso a que Bandeira de Mello se refere quando afirma que só aceitará um modelo em que o Flamengo seja “protagonista”. O Fluminense, por outro lado, não aceita grandes mudanças no seu atual contrato, com vigência de 35 anos. Já acertou com ambos os concorrentes ao Maracanã. O acordo atual é bastante vantajoso para o clube, e deficitário para a concessionária – estima-se prejuízo em torno de R$ 6 milhões por ano.

A assinatura desse contrato chegou a gerar discussões internas na Odebrecht. O Fluminense fica com toda a bilheteria dos setores norte e sul, os populares, que mais vendem, não tem participação em receitas de bar, mas também não tem responsabilidade sobre despesas. Na prática, fica com um estádio para 40 mil pessoas praticamente a custo zero. A concessionária fica com as áreas centrais e mais nobres, que não vendem no mesmo ritmo em jogos de médio ou pequeno porte, e arca com todo o custo operacional.

O contrato da concessionária com o Flamengo, que já se encerrou, previa participação do clube nas receitas de bar e até camarotes, mas também uma boa parte do pagamento da despesa operacional.

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